Ex-papa: o homem que deixou de ser santo.
Devido
ao tamanho da mina ignorância, que normalmente eu subestimo para o meu próprio
bem estar, eu nem sequer sabia que isso de Papa poder renunciar existia. Não
senhor. Existe? Para a minha inculta e não muito católica pessoa, o Papa era
eleito para todo o sempre, tal amor de conto de fadas e casamento celebrado sob
teto católico, para sair de cena apenas com a morte. Não é para ser assim?
Sacrifício desumano para um homem idoso? E alguém em algum dia nesta vida achou
que a Santa Igreja Católica tivesse um toque de humanidade que fosse? E não há
tantos, com tão pouco e de todas as idades a sacrificar-se todos os dias? Afinal,
não é assim que as coisas da igreja são quando nos casamos com ela: até que a
morte nos separe, na saúde ou na doença, na riqueza ou na pobreza, e
blá...blá...blá; mesmo que a convivência da família já esteja para lá de
deteriorada?
A
verdade é que me assustou a tal renúncia como se ela fosse algo inconcebível,
quase um pecado fatal. Como ele pôde simplesmente renunciar? Onde está a
santidade deste homem que neste momento se mostra mais humano do que grande
parte de nós? Bem, por um lado agrada-me em demasia vê-lo assim tão humano,
pois, assim quiçá os crentes poderão ter a medida certa de que são apenas
homens aqueles que os têm ditado regras e que os dizem como devem pensar por
quase dois mil anos. E agora, para meu espanto, o senhor Joseph Ratzinger ainda
cumprirá uma espécie de aviso prévio até o final do mês no comando desta
instituição que tem tentado, tal como qualquer superpotência imperialista,
governar o Universo que nos rodeia e nos permeia. E entre o trágico e cômico,
já posso vê-lo a colocar em caixas de papelão seus pertences pessoais, a
retirar as fotos da família de sobre a mesa e a receber os abraços solidários
antes de fechar a porta do escritório.
Claro
é que por conta do livre arbítrio, como deveria ser a qualquer filho de Deus, o
senhor Ratzinger tem o direito e o dever de fazer o que quiser de sua vida,
pois a ele e a mais ninguém ela pertence. Entretanto, mesmo para mim, que sou
filha de mãe católica nada fervorosa e muito democrática e de pai que se diz
ateu, apesar de chamar-se Jesus, causa certo incômodo tal notícia. Um incômodo
meio burro, é certo, que nos faz sentirmo-nos seguros quando o Mundo caminha
como sempre caminhou e quando o que está pré-estabelecido como uma verdade
única continua a valer pelo simples fato de assim dever ser. Desta maneira nos
sentimos a salvo, e hoje o ex-Papa quebrou a tal segurança e nos fez pensar.
Imagino que deva haver católicos cegos em profunda depressão agora, e que esta
seja uma excelente hora para eles abrirem os olhos e ver o mundo como ele realmente
é pelo menos por uma vez.
Talvez,
a renúncia deste senhor sirva para repensarmos a igreja. Não me refiro à
instituição, mas sim a fé sobre a qual ela foi erguida e que deveria pregar o
amor e a compreensão acima de qualquer coisa. E isso sim, isso eu gostaria
muito de ver: uma igreja muito mais humana e, por isso mesmo, muito mais divina
que, democrática e carinhosa, acolhesse a todos como iguais sem a intenção de
governar nossas mentes e corações. Quem sabe um dia? Por hoje, no final das
contas, agrada-me o fato de pela primeira vez na vida eu ter visto um homem
santo proclamar-se, unicamente, um homem. Seja lá por doença, por jogos
políticos ou pelo que quer que seja, hoje, ao deixar de ser Bento XVI, o senhor
Joseph fez o que de melhor ele podia fazer para a fé de todos nós: ele
mostrou-se homem como qualquer um. Pois crer no homem, mais do que em santos, é
o que precisamos nós por estes dias.
Maristela
Paroli
Obs: Este texto foi escrito por minha coordenadora, a quem admiro pela facilidade que tem em brincar com as palavras de forma tão graciosa.
Espero que gostem tanto quanto eu.
Uma boa semana, cheia de fé.
Alê Pagliuca